Por Arthur Meucci e Flávio Tonnetti

Qualquer creça sobre a existência deve incluir o outro. Nosso futuro não pode ser concebido de modo solitário. Viver é compartilhar com o outro a vida. De modo que aquilo que pensamos sobre nós mesmos deve ser pensado levando em conta a presença de outros, como se nossa vida fosse também uma esperança na vida dos outros. E podemos pensar que somos uma esperança, uns para os outros, porque somos espelhos uns dos outros. A ideia de entrega, presente no ato de caridade, revela essa dimensão altruísta.

Esta espécie de desprendimento repousa no sentimento, ou na consciência, de que o meu agir transborda para além de mim mesmo. Com uma consciência de que meu agir não se limita ao meu próprio corpo ou ao pequeno espaço em que minhas ações acontecem. E, mais ainda, na consideração de que minha própria consciência pode habitar a consciência de outros. Como se nossas ações e manifestações imprimissem um carimbo naquilo que os outros são. E como se eu mesmo, ao deixar esta marca no outro, recebesse também dele algo que me é importante e valioso, como se fôssemos carimbos duplos — daí a ideia de que espelhamos uns aos outros, ou de que somos todos irmãos.

Mais do que não poder fugir de nós mesmos, não podemos fugir a esta experiência de entrega que é dar-se para o outro. Ser é ser em entrega.


Miniensaios de Filosofia, volume: Ética, Medo & Esperança, cap. XII, editora Vozes, 2013.

Arthur Meucci
Bacharel, Licenciado Pleno e mestre em Filosofia pela Universidade de São Paulo, doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Extensão em Filosofia do Cinema pelo COGEAE/PUC. Possuí formação em Psicanálise; Professor Adjunto da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Flávio Tonnetti
Bacharel e mestre em Filosofia pela USP, doutor em Educação pela mesma instituição, com tese sobre educação e tecnologia.
Professor da Universidade Federal de Viçosa.
contato: [email protected]

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