Por Thiago Mota

Certamente você já deve ter olhado para um problema ou uma situação difícil e logo a classificou como algo “complexo”. Às vezes pode ser física para uns, matemática para outros. Há quem ache filosofia algo complexo por demais. Mas o que é complexo para você? O mundo, os relacionamentos, as pessoas ou “simplesmente” a sua própria existência?

O conceito sobre o que é de fato “complexo” nos convida a um olhar mais profundo. Segundo a psicanálise, nem pode ser descrito assim facilmente num dicionário, por exemplo, e diz mais: “O termo complexidade vem do latim complexus, que significa: ‘aquilo que está tecido junto’. Por isso, pode-se dizer que tudo na sociedade e no mundo está tecido junto. Portanto, a complexidade é aquilo que forma as redes nas quais tudo está conectado a tudo”.

Mas esta é apenas uma das definições. Adotada por muitas ciências, da filosofia à tecnologia, a definição de complexidade irá variar de acordo com o contexto em que está inserida.

O entendimento dessa rede de interconexões da qual fazemos parte é vital para uma compreensão da visão sistêmica, ou seja, de um sistema, uma rede na qual estamos interligados. Para compreender melhor a complexidade dessas redes, é importante entender também o que são sistemas.

Segundo Donella H. Meadows, autora do livro Thinking in systems (Pensando em sistemas), “nós somos sistemas complexos — nosso próprio corpo é um magnífico exemplo de complexidade integrada, interconectada, autossuficiente. Cada pessoa, organização, animal, jardim, árvore e floresta que encontramos é um sistema complexo”.

Essa maravilhosa definição da Donella nos mostra como todos estamos integrados a diversos sistemas, cada um com seu grau de complexidade. E o que determina o grau dessa complexidade? O número de conexões que existem entre os atores desse sistema.

Enxergar essa complexidade é vital, pois nos permite uma visão mais clara e real de cenários, problemas, contextos. Num mundo globalizado e conectado como o nosso, essa compreensão é imprescindível para todos — empreendedores, governos, médicos, engenheiros, cientistas etc. Pensar em resolver problemas sem essa compreensão significa gastar tempo e dinheiro em ações que, na maioria dos casos, estarão apenas tratando sintomas, e não de sua causa real.

Pelo menos desde 2015, a habilidade de solucionar problemas complexos vem figurando no topo da lista das “dez mais” do Fórum Econômico Mundial. É um excelente sinal para entendermos que em sistemas complexos, não há soluções imediatas preexistentes. Também por isso vivemos a era da colaboração, pois a inovação e a criatividade orientadas para a solução de problemas são, em geral, mais bem executadas por times e grupos, e não apenas por indivíduos. É também por essa razão que cada vez mais surge a importância de formarmos líderes facilitadores que apoiem grupos neste desafio de elevarem seus graus de consciência, trabalho ao qual me dedico como uma missão pessoal.

Em minhas andanças Brasil adentro, deparo com lugares onde as pessoas já cansaram de ouvir a expressão VUCA, e em outros em que nunca ouviram falar. Sinal de nossas diferenças. A expressão, um acrônimo em inglês, ganhou notoriedade no período da Guerra Fria nos anos 1980 para expressar o mundo daquela época. Mas parece que a classificação V.U.C.A — volátil, uncertain (incerto), complexo e ambíguo — vale até hoje.
Essa visão sobre a complexidade dos tempos atuais foi reforçada pelo físico Stephen Hawking no início do século, quando perguntado sobre qual seria a característica mais importante desta nova era. A resposta dele: a complexidade.
E COMO PODEMOS APLICAR O CONCEITO DE COMPLEXIDADE NA SOLUÇÃO DE PROBLEMAS?

Imagine-se diante do seu carro. Você acaba de entrar e está sentado com a chave nas mãos. O que você precisa fazer? É simples. Basta colocar a chave na ignição e ligar o carro. Mas considere que você faz isso e o carro não funciona. Complicou, né? Pois o cenário tornou-se complicado, ou seja, é provável que você precise de um especialista, um mecânico, no caso, para lhe ajudar a resolver o problema. Mas digamos que o carro andou, você saiu de casa e de repente deparou com o trânsito de sua cidade. Bom, isso é algo complexo de se resolver, pois não há solução imediata, fácil. Exige estudo, testes, aprendizado, tempo, entre outros fatores. Portanto, saber categorizar a que contexto o problema com o qual você está lidando pertence é fundamental antes de apontar caminhos e soluções.

O sociólogo francês Edgar Morin escreveu a obra mais extensa e profunda
sobre o assunto, e é considerado o “fundador da ciência da complexidade” na Europa. Outros pensadores do nosso tempo também têm buscado trazer a visão da complexidade em sua abordagem, como Otto Scharmer, professor do MIT e criador da Teoria U. Para ele, a Teoria U “é um framework que integra sistemas, pensamento, inovação, liderança e presença e que olha sob estas mudanças amplas do ponto de vista da evolução da consciência”. Ele diz ainda que para mudarmos um sistema, dada a sua complexidade, somente é possível de ser alterado se for capaz de olhar para si e se perceber como tal .

E QUAL A VANTAGEM DE SABERMOS MAIS SOBRE A COMPLEXIDADE?

Para Donella H. Meadows: “À medida que nosso mundo continua a mudar rapidamente e se tornar mais complexo, o pensamento sistêmico nos ajudará a gerenciar, adaptar e ver a ampla gama de escolhas que temos diante de nós. É uma forma de pensar que nos dá a liberdade de identificar causas raiz de problemas e enxergar novas oportunidades”.

Ela, assim como outros pensadores, nos convida a um olhar duplo sobre as mudanças com as quais estamos vivendo. Um deles diz respeito a um olhar para dentro e o outro para o externo, para compreendermos o que o futuro quer nos mostrar para que possamos agir no presente da melhor forma possível, encontrando a sabedoria e a coragem necessárias para reestruturar e regenerar os sistemas complexos que nos rodeiam.


Thiago Mota
Sócio e fundador do Novo Expediente, caminho que escolheu para levar mais consciência sobre como lideramos e gerimos as organizações. Formado em Relações Internacionais, tem MBA em Gestão de Negócios pela FGV e atualmente estuda Psicologia Analítica pelo Ijep/SP. É designer de experiências de aprendizagem pela Kaospilot/Copenhagen, mentor de negócios de alto impacto e facilitador de grupos em temas como liderança, cultura e inovação em diversas organizações no País.

Contato: [email protected]

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