Por Gustavo de Oliveira

Depois de uma semana difícil, pensamos em relaxar com algo que nos divirta e nos faça ter uma experiência agradável. Tem quem encontre isso assistindo a um filme, ouvindo música, lendo um livro ou jogando videogame. Porém, nem todos gostam de algo que relaxe, e sim, que desafie e leve aos seus limites de paciência. Pode parecer loucura, mas há quem valorize um bom jogo com um nível de dificuldade elevado. Mas por que a frustração de não passar de uma fase, ao invés de desmotivar alguns, os motiva ainda mais?

Por muito tempo, por motivos de limitação tecnológica, a dificuldade era algo inerente aos videogames. Não existia a mecânica de salvamento, ou seja, se você perdeu todas as suas “vidas”, era obrigado a recomeçar do zero sua jornada. A popularização dos arcades (os famosos fliperamas) também colaborou com esse aspecto, instaurando a competitividade e o desafio entre os jogadores.

Depois de anos de avanços em tecnologia, bastante coisa mudou e atualmente há muitas possibilidades de manter a prática de jogar bem mais acessível, como os salvamentos automáticos e até mesmo a possibilidade de escolher um nível de dificuldade específico. E isso é muito importante, não só para facilitar as coisas, mas também para permitir que pessoas com diferentes condições motoras e cognitivas possam jogar, respeitando seus próprios limites.

Ainda assim, têm aqueles que preferem um bom e velho desafio. Em um primeiro momento, isso pode parecer apenas uma preferência, mas isso diz muito sobre nossas interações sociais e individuais. O designer de jogos Jesse Schell descreve esse fenômeno com uma teoria chamada efeito espada-na-pedra, que faz referência à lenda do Rei Arthur.

De acordo com ele, jogos difíceis representam um meio de persistência e satisfação. A espada pode estar bem presa na pedra, mas todos querem ter a chance de ser aquele que irá tirá-la. Com o auxílio da internet, em que as experiências individuais são constantemente compartilhadas, ser o poderoso que conseguiu tal façanha deixa tudo ainda mais especial. Então, muitas vezes, por mais que as tentativas sejam inúmeras, para alguns vale muito a pena ser desafiado.

Existem explicações científicas que comprovam isso. O psicólogo Richard Ryan, da Universidade de Rochester (Nova York), coordenou uma pesquisa sobre os níveis de dificuldade dos videogames. Segundo ele, os jogadores se dedicam pelo que ele chama de motivação intrínseca. Esse fator pode ser dividido em três aspectos que se complementam: autonomia (a necessidade de ser o motivo de seu sucesso ou fracasso), correlação (necessidade de fazer parte de um grupo) e competência (desejo de controlar e influenciar o futuro).

O pesquisador afirma que, de todos os aspectos, o último é o mais difícil de ser conquistado. Ele não depende apenas do jogador, mas também do funcionamento e programação do jogo. Não adianta ter uma dificuldade desbalanceada, porque é necessária a possibilidade de superar aquele desafio, explica Ryan.

Essa experiência pode ter diversos efeitos positivos no cotidiano dos jogadores. Exercitar a motivação e a persistência, e aumentar a autoconfiança são algumas dessas consequências. Além, é claro, de todo o valor social de se integrar em uma comunidade que divide gostos e tem os mesmos objetivos.

Podemos dizer que até mesmo Freud explica esse contexto. Em seu livro Além do princípio do prazer, de 1920, o psicanalista relaciona como situações de dificuldade e tensão despertam satisfação em nossa mente.

Em sua obra, a alta dificuldade cria uma tensão em nosso cérebro que, quando satisfeita, libera uma dose de serotonina pelo corpo, transformando isso em um ciclo, que nos motiva e nos faz seguir em frente. O que podemos acabar levando para outros aspectos da vida. No final das contas, isso tudo serve para que possamos compreender que videogames refletem, e muito, a forma como enxergamos nossa existência.

Em sua próxima aventura, segure o controle e não desista!


Gustavo de Oliveira
Graduando em Jornalismo pelo Centro Universitário Carioca e técnico em administração. Redator desde 2018 com experiência em música e jogos.

Share: