Por Ronaldo Campos
Quando o programador de software Justin Rosenstein criou em 2009 para o Facebook o botão de joinha (curtidas), não imaginou que após uma década nem tudo da tecnologia seria curtido pelos consumidores e que muitas reações se tornariam techlash.
Techlash é um acrônimo de duas palavras em inglês: 1) technology, de fácil compreensão e 2) backlash, que não é tão óbvia para nós, mas pode ser compreendida como uma reação negativa a determinada questão social ou política. Geralmente, o alvo da techlash são algumas das maiores empresas de tecnologia do mundo: Google, Apple, Amazon, Meta (empresa-mãe do Facebook, Instagram e WhatsApp) e Microsoft. Podem surgir dentro das empresas, por exemplo, acusações de funcionários sobre o ambiente tóxico de trabalho e de assédio sexual, ou podem ser reações externas, tais como acusações sobre vazamento de dados dos usuários, a demora para coibir a disseminação de fake news e o uso abusivo de informações pessoais dos consumidores.
Não há dúvida de que os avanços tecnológicos possibilitam uma melhor qualidade de vida. Reencontrar os amigos pelo Facebook, fazer compras on-line, a facilidade de utilização das ferramentas de busca e estar conectado com o mundo são algumas das maravilhas da tecnologia moderna. Porém, a evasão fiscal, a competição predatória, a violação da privacidade, a utilização dos algoritmos que determinam o que o usuário “vê” e a subversão da democracia, principalmente em períodos de eleição, são um alerta para o poder desmesurado que as big tech têm. Será que a solução é simplesmente limitar o poder?
Em maio de 2016, entrou em vigor na União Europeia uma lei de proteção de dados que limita o poder das empresas de tecnologia. A General Data Protection Regulation garante aos europeus informações sobre como seus dados serão utilizados, onde foram obtidos e impõe uma transparência para que as companhias informem o propósito para a utilização dessas informações. Por nossas bandas, em 2014, o Marco Civil foi promulgado com o objetivo de garantir a liberdade de expressão, de comunicação, de manifestação do pensamento, de proteção da privacidade dos usuários e a neutralidade da rede.
Porém, o significado do nome rede dá uma pista de que tudo na internet está interligado. Não adianta criar uma política local para limitar o poder das companhias se o sistema global não for pensado como um todo. A rede é única e é interconectada. Os especialistas dizem que se alguns dos serviços prestados, por exemplo, pelo Google, YouTube, Gmail, Google Maps ou Chrome deixarem de acessar a base comum de dados de nossas informações, o resultado da consulta será insatisfatório. Outro risco está na demasiada restrição operacional das big techs. Se restringidas em demasia, outras empresas ocuparão seus lugares. Quando o governo americano limitou um pouco as operações do Google, de imediato a empresa russa de busca Yandex ampliou sua atuação global. Também serve para as empresas chinesas Baidu, Weibo e Alibaba, que miram respectivamente o Google, o Facebook e a Amazon.
A informação é o ponto-chave. Quando pesquisamos no Google, visitamos um site ou damos um like no Facebook, as big techs aprendem um pouco mais sobre nós. Elas usam as nossas informações para customizar os serviços e torná-los cada vez mais atrativos. O poder das empresas de tecnologia está em conhecer as preferências de cada usuário e, discretamente ou não, prever o nosso comportamento ao navegarmos pela rede. Por sua vez, o comportamento humano está diretamente ligado à psique e são as nossas vulnerabilidades que abrem espaço para as techlashes. Talvez uma postagem não curtida possa arrasar o sentimento de alguém, um cancelamento possa se tornar mortal, o baixo número de “amigos” no Facebook possa criar um sentimento de inferioridade e assim por diante. O importante é não se perder nesse emaranhado de informações e não se esquecer de quem você realmente é. No mais, é continuar navegando e curtir as vantagens e facilidades da tecnologia.