Por Camila Barreto
Recentemente, uma nova tendência comportamental entrou no radar de muitas empresas ao redor do mundo. Entre os perfis identificados no relatório WGSN Futuro Consumidor 2026, que apresenta e analisa quatro perfis comportamentais e suas tendências de consumo para os próximos anos, estão os glimmers — “deslumbrados” —, que representam essa tendência crescente entre Millennials e a Geração Z pela busca das “microalegrias”, encontradas na forma de consumo.
De acordo com o estudo, o aumento do custo de vida global e a instabilidade do mercado de trabalho incentivam esse grupo a buscar a felicidade e a realização em pequenos momentos, de modo a celebrar suas conquistas em um ritmo mais lento, mas constante.
Mais evidente ainda entre os jovens da Geração Z, essa prática nada mais é que um reflexo do impacto provocado pelo cenário no qual estão inseridos: de incertezas econômicas, crises sociais e ambientais, questões de saúde mental etc. É uma tentativa de equilíbrio, uma espécie de recompensa.
A ideia de oferecer a si mesmo um pequeno mimo, como um café ou um docinho superfaturado, uma peça de roupa nova, um acessório ou um lip balm não é uma experiência individual. A hashtag #overpricedcoffee, por meio da qual jovens de diversos lugares compartilham o seu momento de microalegria ao lado do seu latte do Starbucks, já acumula mais de 5 milhões de visualizações no TikTok. De igual modo, são numerosos os conteúdos que mostram como o consumo de determinados produtos funciona como forma de proporcionar para si pequenas doses de prazer.
Quando os discursos meritocráticos ligados à cultura do hustle, que valoriza o trabalho incessante visando a acumulação de bens materiais, entram em decadência — posto que, a essa altura do campeonato, nós já sabemos que acordar às 5h da manhã e trabalhar muito o dia inteiro em jornadas exaustivas e desumanas não é o que vai fazer de nós milionários aos 23 anos, já que ser milionário não depende só da nossa força de vontade —, os jovens encontram no consumo um prazer imediato e uma forma de alento.
Existe nessa tendência uma reconfiguração do padrão de consumo. Se a lógica atenta para o fato de que os custos de vida atuais não permitem que esses jovens comprem uma casa, então o cafezinho superfaturado e o doce de suporte emocional despontam como uma maneira de celebrar as pequenas conquistas, de lidar com o peso da rotina e melhorar o dia com um pequeno mimo.
É fato que o consumo ligado à busca do prazer imediato pode não ser o melhor remédio para lidar com tudo isso. Contudo, é interessante notar como tal tendência reflete uma tentativa dos jovens de encarar as pressões sociais e econômicas, buscando equilíbrio e bem-estar em um pequeno momento feliz em meio a um cenário de incertezas.
No contexto em que o modelo tradicional de sucesso, baseado em sacrifícios extremos e burnouts e em “cortar o cafezinho para guardar dinheiro”, já não faz tanto sentido, as microalegrias se apresentam como uma forma de resistência emocional, permitindo que a Geração Z desacelere e celebre as pequenas vitórias do dia a dia. Obviamente, tudo isso também nos leva a refletir como a conjuntura caótica é extremamente lucrativa para alguns, já que, para lidar com tantas incertezas e aflições sociais e profissionais, a saída mais flagrante é comprar produtos atrelados a momentos de felicidade.
Camila Barreto foi vencedora do Projeto Escrita 2019 e se tornou colunista da revista INSPIRE-C. Atualmente estuda Letras na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.