Por Gustavo de Oliveira
O término de alguns ciclos da nossa vida pode representar o fim de muitos aspectos que dão sentido a ela. Perder o emprego, mudar-se ou até mesmo terminar o Ensino Médio podem ser rupturas com as quais não sabemos como lidar, principalmente quando esses elementos fazem parte da nossa rotina e da normalidade da nossa vida. O extraordinário parece ser incrível, mas o comum é o que realmente nos define.
Baseado nesse sentimento, o jogo A Space for the Unbound conta uma história intimista e tocante. Feito pelo Mojiken Studio, um grupo de desenvolvedores da Indonésia, o título segue uma narrativa bastante influenciada por animações japonesas de diretores como Makoto Shinkai, Hayao Miyazaki e Isao Takahata. Além de emular um gênero de mangás conhecido como slice of life, que emula o realismo do mundo e as experiências da vida em formato de arte e entretenimento.
Nele acompanhamos o protagonista Atma e Raya, sua namorada, cumprindo uma lista de atividades que eles querem realizar antes de se formar no Ensino Médio, no final dos anos 1990. E por trás de todas as atividades mundanas e corriqueiras que precisaremos realizar durante a jogatina, iremos encontrar temas dramáticos e poderosos. Aqui são exploradas situações que envolvem bullying, depressão, ansiedade e a chegada da vida adulta. Tudo isso com tons de fantasia, mas que não deixam de ser sensíveis e cuidadosos.
Outro aspecto muito forte do jogo é a representação da visão dos desenvolvedores sobre as transformações que a Indonésia vinha passando na virada do milênio. Também exibe as experiências de um povo, que, assim como o brasileiro, foi colonizado e estava descobrindo novos aspectos sociais, políticos e tecnológicos por meio da globalização. Isso serve como um ponto de identificação muito forte, pois ajuda na imersão durante a história e na compreensão de como o meio influencia nossos sentimentos e nosso agir no cotidiano.
A Space for the Unbound não se propõe (pelo menos não de forma ativa) a tratar de grandes questões filosóficas. Mas aborda o cotidiano e a maneira como nos relacionamos com o comum e tudo que o cerca. Apesar de seus temas relativamente pesados e tocantes, não busca ser uma experiência desconfortável, mas, sim, ser um jogo que nos ensina a valorizar a vida e os acontecimentos dela. Pois, até mesmo durante as adversidades, podemos encontrar valor nos aprendizados e nas pessoas que dividem os dias conosco. O jogo é uma pausa, um respiro necessário na correria do dia a dia e que surpreende pela aproximação do drama e da fantasia com o ordinário da vida real.
Gustavo de Oliveira
Graduando em Jornalismo pelo Centro Universitário Carioca e técnico em administração. Redator desde 2018 com experiência em música e jogos.