Por Renata De Luca
De acordo com o IBGE, o desemprego aumentou 13,1% no segundo trimestre de 2020. O País contabiliza 13,5 milhões de pessoas sem trabalho formal. O setor com maior índice de perda foi o comércio (2,1 milhões), seguido por serviços domésticos (1,3 milhões) e construção (1,1 milhão).
Apesar das medidas protetoras do emprego lançadas pelo governo, a longa pandemia deixa sem opções diversos setores e torna ainda mais difícil fazer a demissão de alguém, pois sabemos da dificuldade em encontrar um novo trabalho.
É desconfortável comunicar a dispensa, mesmo que a decisão esteja amadurecida, porém é um momento importante na relação profissional e deve ser tratado com seriedade, embasamento e respeito. Aqui vão algumas orientações simples, porém relevantes.
A dispensa deve ser comunicada pelo gestor imediato do demitido e não pelo RH ou delegada para outras pessoas. Quem é dispensado tende a ver a delegação como falta de consideração ou descaso e pode se sentir desnecessariamente ferido. Quando o líder fala, olho no olho (vale o virtual para o momento), a sensação de relevância aumenta e será um fator a menos na lista das possíveis mágoas.
A conversa deverá ser objetiva e rápida. Não é hora de rememorar, puxar exemplos, argumentar longamente e dar feedbacks se a decisão está tomada. Devemos ser sinceros, porém detalhes nesse momento não ajudarão quem acaba de receber uma notícia desagradável e precisará de um tempo para assimilar e compreender o que está acontecendo. Este, aliás, é um erro muito comum cometido pelo portador da má notícia: explicar muito para alguém acometido por um torpor que não o deixa escutar.
Trabalhei por alguns anos no setor de saúde mental de um hospital de oncologia pediátrica e acompanhei inúmeras transmissões de diagnósticos de câncer para os pais. Quem dava a má notícia, invariavelmente, seguia falando de detalhes do tratamento diante de pais impactados, que retornavam para a consulta seguinte com perguntas básicas, como se nada tivessem ouvido. Ouvido tinham, mas não escutado, pois para isso necessitavam de um tempo de assimilação. Em geral, continuar falando só acalmava quem dava a notícia, pois podia se manter no campo da razão. As chances de aumentar o desconforto de uma situação já difícil, detalhando as razões da demissão, são enormes e podem despertar no demitido o desejo de argumentar sem poder, gerando mais raiva motivada pela frustração.
A postura deverá ser de respeito, honestidade e gratidão. Mesmo que a experiência profissional não deixe saudades, agradecer e oferecer apoio conforta. Porém, mantenha a postura profissional; nada de chorar junto ou dizer frases como “sei como você está se sentindo”, “me coloco no seu lugar” etc. Mantenha o autocontrole e transmita firmeza. Oferecer ajuda não quer dizer se posicionar como amigo, e sim dar uma carta de recomendação, manter o convênio médico por um período ou arcar com uma consultoria de recolocação profissional, por exemplo.
Muitas vezes, a pessoa demitida apela para um pedido de exceção, como ficar uns dias acessando os sistemas ou usando o telefone corporativo. Trata-se de uma situação delicada e polêmica que deve ser evitada. Deve-se seguir o compliance da companhia, pois a responsabilidade é do gestor. Valem a transparência e o apelo ao procedimento.
Outro ponto importante: a verdade é que a grande maioria das pessoas não tem maturidade ou preparo para cumprir um aviso prévio. O desgaste do clima organizacional e o impacto da improdutividade causada pelo desânimo podem ser enormes. São poucos os profissionais que compreendem a situação e continuam trabalhando durante esse período. Em geral, o empregador que opta pelo cumprimento do aviso prévio também não vê a hora de o prazo terminar.
Finalizando, devemos lembrar que a demissão é o fim de uma etapa. Se ela for recorrente para um determinado cargo, temos aí um ponto de atenção. Se for maior em uma área específica, o líder, a função, os atributos e o clima devem ser analisados. E, para isso, servem as entrevistas de desligamento realizadas após alguns dias por um terceiro imparcial, que poderá colher importantes dados. Parece simples, mas não é tão usual. Sua empresa tem essa prática? Pense nisso.
Renata De Luca
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Diretora de RH da Security Segurança e Serviços, psicóloga (PUC/SP), psicanalista (IP/USP), mestre em Educação (FE/USP) e MBA em Gestão de Pessoas (FGV).