Por Catarina Coelho da Rocha Lima, 16 anos, estudante do ensino médio no colégio Marista de Goiânia
Meu nome é Catarina Coelho da Rocha Lima, tenho 16 anos e estudo no colégio Marista de Goiânia. Participei de um projeto incrível do nosso HUB de códigos e linguagens, uma aula em que a turma é dividida em quatro frentes de pesquisa relacionadas aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU, que têm o objetivo de solucionar diversos problemas até 2030. Os objetivos das ODS do nosso projeto basicamente são: conseguir a igualdade de gênero, empoderar todas as mulheres e meninas e acabar com a desigualdade.
O grupo todo ficou superenvolvido e decidimos fazer um curta-metragem usando a linguagem artística do cinema para abordar a gravidez na adolescência, algo muito comum em nosso país. Quisemos justamente mostrar tanto o lado do garoto quanto o da garota nessa situação.
Também fizemos um trabalho de campo visitando o Cevam (Centro de Valorização da Mulher), que acolhe mulheres que passaram por diversos tipos de violência: psicológica, física, sexual, dentre outras. Conhecer a história dessas mulheres me deixou muito chocada com quanto a violência contra a mulher, principalmente a doméstica, está muito presente na nossa sociedade, porém, de forma silenciosa, dentro das casas, o que faz com que poucos fiquem sabendo.
A violência doméstica em Goiás é a segunda maior do Brasil, só perdendo para o Piauí. A dor física que essas mulheres passam obviamente é imensa, mas é ainda pior a dor interna, o trauma que fica marcado para sempre dentro delas. E o pior de tudo, esse tipo de violência, por ser dentro das nossas próprias casas, é praticada por pessoas próximas: pais, padrastos, avôs, maridos, tios etc., o que faz com que a dor seja ainda mais forte, quando transformamos afeto em nojo e dor.
Saindo de lá eu sabia que não podia dar uma ajuda direta para aquelas mulheres a não ser com simples doações. Pensei então em recorrer ao governo, que poderia conhecer a história do Cevam e assim dar uma ajuda muito maior do que a minha. Chegando em casa, escrevi uma carta à primeira-dama do estado pedindo para que ela ajudasse e conhecesse a história dessas mulheres. Em resposta, ela disse que faria o possível para ajudar o Cevam e que procuraria saber tudo o que fosse preciso, e se mostrou disposta a ajudar.
Por mais que não pareça, os assuntos gravidez na adolescência e violência contra a mulher estão muito interligados, pois o machismo e a desigualdade de gêneros também são formas de violência, que estão presentes todos os dias em nossas vidas, sem que possamos perceber. A gravidez para a garota sempre será pior pelo olhar da sociedade — a mulher sempre será mais julgada, pois ela está carregando um bebê na barriga. O homem não vai perder oportunidades, não vai deixar de estudar, não terá que amamentar.
Se pararmos para pensar, o machismo está presente em coisas que podemos até considerar simples e banais em nosso dia a dia
Sinceramente, as pessoas que pensam que as mulheres não sofrem estão profundamente enganadas. Há séculos mulheres eram consideradas inferiores aos homens e, graças aos movimentos em defesa da mulher, atualmente, nós mulheres temos direito ao voto, a sair de casa sem estar acompanhada de um homem, à liberdade de expressão e ao intelecto. Você sabia que se não fosse por mulheres lutadoras, em busca da nossa igualdade, nós não teríamos o direito de ler um livro atualmente? Um simples livro, de história, filosofia ou qualquer assunto que seja. As mulheres não tinham o direito de exercitar a mente, de ter acesso ao intelecto. Eram obrigadas a permanecer dentro de casa cuidando dos afazeres domésticos, dos filhos e servir de objeto sexual a seus maridos, além de serem submissas a eles. Não interessava se uma mulher tinha uma opinião ou uma forma de pensar diferente da de seu marido, isso não poderia existir nunca, pois as mulheres não tinham direito à liberdade de expressão, nem a se politizarem, muito menos a votarem. Graças às feministas, temos tudo isso hoje.
Se pararmos para pensar, o machismo está presente em coisas que podemos até considerar simples e banais em nosso dia a dia, mas que fazem toda a diferença no sentido de que ele fique cada dia mais instaurado na nossa sociedade. Como, por exemplo, na religião. No antigo testamento da Bíblia temos um conto mitológico conhecido por todos: o de Adão e Eva. Quando Deus chegou ao sexto dia, decidiu criar o ser humano, mas é claro que quis criar primeiro o homem, Adão, que foi esculpido por Deus, diferentemente de Eva, que foi feita da costela de Adão. A mulher considerada a primeira figura feminina da história, segundo a Bíblia, veio de outro homem, e ainda por cima foi a pecadora que comeu do fruto proibido e que deu ouvidos à serpente, fazendo com que o pecado ficasse instaurado na humanidade. Além disso, no próprio Gênesis, temos um trecho que diz que a partir daquele momento Adão seria dono de Eva, e que ela deveria fazer todas as suas vontades e obedecê-lo.
Dá pra perceber quão machista isso é? Por que o homem e a mulher não podiam ter sido criado juntos? Por que os dois não podiam ser responsáveis pela criação do pecado? E por que a mulher tem de ser apenas uma consequência do homem? Por mais ficcional e mitológico que esse conto seja, apesar de ter sido escrito há milênios, tem fácil acesso a todos até hoje pela Bíblia, que é um dos livros mais lidos do mundo. Portanto, como isso deve ficar marcado na mente de cada um que está lendo? E mais, nenhuma mulher deve seguir ordens ou ser submissa a um homem, mas a religião e diversos outros meios fazem com que essa ideia seja vista como algo cada vez mais natural e aceitável.
Outra forma de machismo muito comum no nosso dia a dia é a forma de tratamento familiar entre meninos e meninas. As meninas devem sempre ajudar as mães, mas os meninos podem jogar videogame o dia todo que não tem o menor problema, pois a mulher sempre vai ser a que sabe cuidar melhor da casa, até porque ela tem uma “habilidade natural” para isso. Outra coisa, muito comum, é o padrão de beleza — a pressão para a mulher estar sempre maquiada, magra e perfeita é muito maior do que para o homem. A mulher tem de ser um modelo para os homens, tem de se vestir para os homens e estar sempre bonita, senão nenhum homem nunca a desejará. O homem pode andar largado, não precisa se importar, que não tem o menor problema. Homem compra e veste a roupa que quer sem pensar se uma mulher vai gostar ou não.
Eu fico extremamente decepcionada com mulheres que não apoiam o feminismo, ou pior, que julgam ser um movimento agressivo, quando na verdade a única intenção é dar às mulheres as mesmas oportunidades e direitos que um homem tem. Não, nós não queremos ser iguais aos homens, queremos nos empoderar da força feminina que existe dentro de cada uma de nós.
A carta que eu escrevi foi só uma pequena atitude perto do que milhares de outras mulheres já fizeram por nós, como Malala, Joana D’Arc, Marie Curie, dentre outras, que mudaram sua sociedade por meio de seus atos pelas mulheres. Eu penso nas milhares de feministas que morreram queimadas na fogueira por nós, mulheres, que estamos aqui hoje tendo milhares de direitos que elas não tiveram em suas épocas.
Mas, agora, nosso papel é dar cada vez mais direitos à nova geração de mulheres que está por vir e não deixar jamais essa luta pelo feminismo cessar.
Créditos e agradecimentos a minha professora Janaína Romão, que foi uma excelente instrutora no nosso projeto das ODS (Fifteen) e a todos que fazem parte do grupo: Roberta, Erick, Sérgio, Giovanna, Thais, Luana, Natália e Hévellyn.