Texto adaptado | RONALDO CAMPOS

Embora as conquistas, a partir da Revolução Francesa de 1789, tenham possibilitado a consolidação da concepção de cidadania, elas ainda não são suficientes, pois se constata que a mera declaração formal das liberdades nos documentos e nas legislações se desfazem frente à inexorável exclusão econômica de uma boa parte da população. Desde o século XIX, busca-se implantar com mais vigor os direitos sociais por meio de ações estatais em prol da saúde, da educação, da moradia, do trabalho, do lazer e da cultura para todos.

Mas não cabe unicamente ao poder público reparar as desigualdades. As empresas, por sua vez, devem primar pelo respeito ao princípio constitucional do valor
social do trabalho e da livre iniciativa, para que se implementem a cidadania plena e a dignidade do trabalhador com ou sem deficiência (art. 1º e 170 da
CF/88). Nesse sentido, a contratação, por exemplo, de pessoas com deficiência deve ser vista como qualquer outra, uma vez que se espera do trabalhador, nessas condições, profissionalismo, dedicação, assiduidade, enfim, atributos ínsitos a qualquer empregado. Não se quer assistencialismo por parte das empresas, e sim oportunidades.

O Brasil conta com 24 milhões de pessoas com deficiência, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essas pessoas, porém, não circulam nas ruas, nas escolas comuns, nos locais de lazer e cultura e muito menos têm acesso ao trabalho. É hora, portanto, de se reverter esse quadro. Os problemas que daí decorrem refletem-se na baixa escolaridade desse grupo, grande dificuldade de inserção social, de constituição de vínculos familiares para além dos lares paternos e maternos. Esse muro institucional pode e deve ser rompido por meio do comprometimento de todos. Por exemplo, muitas empresas alegam que a baixa escolaridade impede o aumento da contratação. Então, como a empresa deve encarar a escolaridade?

Às pessoas com deficiência também não foram dadas iguais oportunidades de acesso à escolarização. Entretanto, muitas vezes, apesar de não terem a certificação, tiveram acesso ao conhecimento por meio do apoio da família ou da comunidade local. De outro lado, muitas vezes é exigido, de forma generalizada, um patamar de escolaridade que não é compatível com as exigências de fato necessárias para o exercício das funções. Assim sendo, ao candidato deve ser dada a oportunidade de fazer um teste para revelar suas reais condições de realizar o trabalho (art. 36, alínea “c”, da Recomendação nº 168 da OIT,
c/c item 4 do Repertório de Recomendações Práticas da OIT: Gestão de questões relativas à deficiência no local de trabalho).

As empresas devem, assim, cumprir a lei em questão, esforçando-se para implantar programas de formação profissional, flexibilizando as exigências genéricas para a composição de seus quadros, de modo a, objetivamente, abrir suas portas a esse grupo social em evidente estado de vulnerabilidade. Nesse sentido, outra solução seria o trabalho conjunto com organizações não governamentais e/ou o Sistema S (SENAI, SENAR, SENAC, SENAT e SENACOP). Essas organizações detêm um conhecimento acumulado há décadas acerca das potencialidades das pessoas com deficiência e dos métodos para sua profissionalização. Recente alteração legal (Lei nº 11.180/05) possibilita a formalização de contratos de aprendizagem para pessoas com deficiência, sem limite máximo de idade, sendo possível a combinação de esforços entre as empresas e as instituições mencionadas (Lei nº 10.097/00).


Foto de Takehiro Tomiyama/Unsplash
Fonte bibliográfica: A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. – 2. ed. – Brasília: MTE, SIT, 2007.

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