Por Ronaldo Campos

Num mundo repleto de informações difusas e irrelevantes, quem consegue separar o joio do trigo e ter clareza das informações que realmente importam tem poder. Por exemplo, qualquer pessoa pode participar de um debate sobre o futuro da humanidade, mas poucas saberão selecionar as informações relevantes, e não falsas, para argumentar e sustentar suas ideias.

Outra questão que surge é como envolver o maior número possível de pessoas nas discussões dos assuntos que afetam a todos. Somos quase 8 bilhões de pessoas e cada uma tem seus compromissos e prioridades. Se numa empresa com cinco colaboradores já é difícil agendar uma reunião, imagine com 8 bilhões de pessoas. E como priorizar um tema que parece “distante” em detrimento das prioridades imediatas? Uma mãe solteira que ganha um salário mínimo e tem três filhos pequenos está muito mais preocupada em alimentá-los do que em discutir, por exemplo, o aquecimento global. Uma pessoa com câncer está mais preocupada em se curar do que com a violência nas escolas. Um trabalhador desempregado pensa 24 horas em encontrar um novo emprego.

Não pretendo vilipendiar os problemas individuais, mas, pelo contrário, chamar a atenção para a conexão que existe entre as questões individuais e as globais. Devido à revolução tecnológica, há uma fusão quase completa entre elas. Quando uma garotinha sueca resolve cabular aulas para protestar contra o aquecimento global, o que está em jogo não é se ela repetirá ou não o ano por faltas, mas sim um debate generalizado sobre se a humanidade sobreviverá por causa das mudanças climáticas. Quando um policial branco decide matar por asfixia um homem negro em Minneapolis, nos EUA, desperta uma onda global de protestos contra o racismo.

Estamos conectados de tal maneira que uma ação individual poderá causar uma grande manifestação. Foi o que aconteceu quando um jovem vendedor de frutas resolveu protestar contra as intimidações que vinha sofrendo da polícia tunisiana. Mohamed Bouazizi tinha 26 anos quando ateou fogo ao próprio corpo. A sua banca de frutas havia sido confiscada e não lhe permitiram dialogar com as autoridades locais. Rapidamente o ato de Bouazizi se espalhou pelas redes sociais e as populações dos países vizinhos aderiram a uma grande onda de protestos, que ficou conhecida como a Primavera Árabe.

As escolhas individuais têm poder de causar impactos globais. Como estamos acostumados a pensar que a história é construída sem a nossa participação, acreditamos que tanto faz escolher, por exemplo, entre as opções A ou B, pois estamos acostumados a pensar que as nossas escolhas não terão outras consequências senão as pessoais. Contudo, o mundo atual exige cada vez mais a capacidade de considerar e refletir, com muita acuidade, sobre as escolhas que fazemos. Por sorte, esta é uma habilidade que pode, e deve, ser aprendida, exercitada e aperfeiçoada para não cairmos no “efeito lagarta”.

O “efeito lagarta” é o resultado de um experimento realizada pelo entomologista Jean Henri Fabre (1823-1915). Fabre observou que as lagartas sempre saem em fila para buscar seus alimentos e deixam um fino rastro sedoso enquanto se deslocam. Ele queria descobrir se havia alguma característica específica pertencente à lagarta líder, já que a segunda da fila se desloca fielmente sobre o rastro deixado pela primeira lagarta. Esse processo de deslocamento se repete com todas, ou seja, a da frente deixa um rastro para a anterior, que se desloca sobre ele, e assim sucessivamente.

Com muito cuidado, o cientista removeu a lagarta líder para o último lugar da fila e fez com que elas formassem um círculo. Nessa disposição, não havia mais liderança e a ex-líder simplesmente continuava seguindo o rastro deixado por aquela que ia à frente. Segundo ele, as lagartas andaram em círculo por seis dias. Se fossem humanos, teriam percorrido 145 quilômetros sem descanso, sem água e sem alimento, ou seja, todas teriam morrido. Fabre conclui o experimento dizendo que elas se aferraram obstinadamente ao fio sedoso porque não dispõem de nenhum mecanismo ligado à razão que as fariam abandonar o percurso circular.

É fácil perceber os impactos das decisões globais em nossa vida. O que não percebemos com tanta clareza é a potencialidade que as decisões individuais têm para criar impactos globais. Afinal, o nosso destino e o da humanidade dependem do fino rastro sedoso que escolhemos seguir.

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