Texto | RONALDO CAMPOS

No final da década de 1960, Gilberto Gil e Caetano Veloso plantaram a semente da música brasileira contemporânea. Líderes do tropicalismo, souberam interagir com outros sons universais sem perder a brasilidade.

A Bahia, que também é a terra natal de João Gilberto, é o maior celeiro de interação da música brasileira contemporânea com o mundo. Foi lá que o batuque do Olodum, da Banda Didá, do Ilê Aiyê e de outros blocos afros se fundiu com a batida reggae e criou o samba-reggae — ritmo que é a célula-mãe da axé music. Vale a pena destacar que o Ilê Aiyê, além de ser o primeiro bloco afro de Salvador, criado em 1974, transcende o batuque e é um verdadeiro movimento cultural e social, não só pela reinvenção do carnaval da Bahia, mas principalmente pelo olhar sobre as relações raciais no Brasil.

Infelizmente, a axé music teve sua força diluída pela indústria fonográfica brasileira quando lançou sucessivas gravações de baixa qualidade. Mesmo assim, quem vai a Salvador logo percebe que seu ritmo ainda impera nas ladeiras da cidade e o som de seus tambores ecoa mundo afora. Astros como Paul Simon e Michael Jackson já recrutaram o batuque do Olodum. Quanto aos astros verde-amarelos, Daniela Mercury é a cantora que propagou com mais ênfase a música baiana a partir dos anos 1990.

A música brasileira contemporânea não é só baiana. No Recife, o falecido Chico Science, junto com seu grupo Nação Zumbi, reprocessou o maracatu, ritmo regional, à linguagem pop. Nascia o manguebeat, que se tornou um movimento pela valorização das culturas regionais nordestinas e ajudou no desenvolvimento de uma identidade local própria — além de criticar as condições de vida da população e a preservação do manguezal.

Fenômeno semelhante ao de Pernambuco, mas ainda restrito ao Espírito Santo, aconteceu mais recentemente em Vitória, capital do estado. O grupo Casaca arrasta multidões para ver seus shows. A receita, no caso, é tocar o congo (tradicional ritmo capixaba) com a mesma linguagem pop com que Chico Science fez com o maracatu.

Por conta desses fenômenos locais, segmentação e pluralidade tornaram-se as palavras-chaves da música brasileira contemporânea. Aos olhos do mundo, o Brasil é cada vez mais reconhecido pela sua produção musical. Já faz muito tempo que esse reconhecimento não se limita ao visual exótico de Carmen Miranda ou à batida da bossa nova, que bebeu nas águas do jazz e, por isso, foi rapidamente assimilada pelos norte-americanos. A música brasileira contemporânea tem identidade própria e ao incorporar um sotaque pop, fica cada vez mais forte para continuar conquistando o mundo.


Diagramação | RONALDO CAMPOS
Foto de Lee Pigott/Unsplash

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