Por Arthur Meucci e Flávio Tonnetti
Agimos conforme nossa natureza. Estamos presos a esta condição. De modo que toda deliberação ética é um equívoco. Não é possível pensar a ação humana a partir da razão ou do pensamento. A consciência é apenas um efeito colateral, um fenômeno paralelo, gerado pelos nossos impulsos e instintos. Somos escravos de nossas pulsões e agimos conforme o que nos ordenam. Não há vontade livre, portanto. Não há ação livre, posto que não podemos agir contrariando nossa constituição original.
A parábola do escorpião que atravessou o rio sobre as costas de um sapo ilustra bem esta posição: vendo a água subir durante uma enchente, o escorpião pediu ao sapo que o atravessasse para o lado seguro e seco da outra margem do rio. O sapo, desconfiado do escorpião, recusou-se, argumentando que não queria ser picado por um ferrão. O escorpião, para acalmar o sapo, racionalmente explicou que se o picasse com seu ferrão ambos afundariam no meio das águas. Convencido dos argumentos do escorpião, e seguro que o escorpião não desejava causar a própria morte, mas apenas salvar-se e manter-se vivo, o sapo resolveu conduzi-lo sobre suas costas até o outro lado. Mas o escorpião, no meio do caminho, picou o sapo. Desesperado, o sapo aclamava enquanto ia afundando: — Por que fez isso, não sabes que irá morrer junto comigo? Ao que o escorpião lhe contestou: — Não posso negar minha própria natureza.
Miniensaios de Filosofia, volume: Ética, Medo & Esperança, cap. XXII, editora Vozes, 2013.
Arthur Meucci
Bacharel, Licenciado Pleno e mestre em Filosofia pela Universidade de São Paulo, doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Extensão em Filosofia do Cinema pelo COGEAE/PUC. Possuí formação em Psicanálise; Professor Adjunto da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Viçosa (UFV).
Flávio Tonnetti
Bacharel e mestre em Filosofia pela USP, doutor em Educação pela mesma instituição, com tese sobre educação e tecnologia.
Professor da Universidade Federal de Viçosa.
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Foto de Raphael Brasileiro/Unsplash