Mariangela Carocci

Conversar com um bebê, sorrir e lhe dar colo é tão fundamental quanto mantê-lo alimentado, limpo e descansado. Isso porque, quando os sinais de desconforto de uma criança são atendidos de forma sensível, o vínculo entre ela e o seu cuidador vai se fortalecendo. E é por meio de um vínculo seguro que a criança desenvolve sua integridade física, emocional e relacional, sua autonomia e independência.

Não é preciso muito. São as atitudes simples e a presença com qualidade que fortalecem os vínculos e as relações afetivas. Alguns minutos a mais de brincadeira no banho, um colo oferecido em um momento de medo, olhos nos olhos na hora de estabelecer um diálogo ou uma risada bem-humorada quando tudo dá errado. É assim, com gestos cotidianos e aparentemente despretensiosos, que colocamos em prática um consenso precioso — e por que não, um dos mais belos — da neurociência: o afeto — oferecido ao bebê, à criança ou ao jovem, ajudará a tecer sua personalidade e servirá como preventivo contra doenças como a ansiedade e a depressão.

A qualidade da relação afetiva influenciará a resistência às frustrações, a compreensão com maior facilidade do teor de um texto complexo e se conseguirá se adaptar em um mundo no qual tudo muda muito rapidamente. E, principalmente, se irá conseguir estabelecer com a sociedade uma relação de amor em vez de ódio, de compreensão em vez de soberba e de respeito em vez de desprezo por tudo que for diferente dela própria.

Segundo as pesquisas, crianças privadas de afeto apresentam, entre outros prejuízos, alterações no funcionamento de áreas cerebrais associadas ao processamento das emoções. É a ausência do afeto comprometendo a arquitetura cerebral.

Os efeitos serão observados no longo prazo, na idade adulta. Há uma clara evidência de que crianças que não desfrutaram vínculos afetivos sólidos terão maior tendência à agressividade e ao desenvolvimento de doenças psiquiátricas (depressão, por exemplo) e tendência a comportamentos agressivos e destrutivos.

Cabe aos adultos — pais e cuidadores — assegurar que o ambiente seja composto de proteção, segurança e amor.

Os estudos da neurociência comprovam que a negligência emocional praticada por pais e cuidadores em relação às crianças deixa marcas nos circuitos neuronais e, futuramente, essas cicatrizes podem contribuir para o surgimento de sérios distúrbios afetivos.

É claro que vários outros fatores contribuem para o desenvolvimento cerebral, a formação da personalidade ou para o risco de surgimento de alguma patologia psiquiátrica. A genética é um deles. Mas é fato que a associação entre os genes e o ambiente definirá o resultado. Sobre a genética ainda não há muito o que pode ser feito. Mas sobre o ambiente, sim. Portanto, cabe aos adultos — pais e cuidadores — assegurar que ele seja composto de proteção, segurança e amor.

Ler um livro juntos antes de dormir, organizar um piquenique no parque, receber uma ligação para saber se chegou bem de viagem, participar de uma tarde de pedalada no parque, assistir a um filme juntos, preparar uma refeição, ser ouvido com atenção e sem julgamento, conversar sobre algo que não o deixou feliz, validar tristezas e alegrias são nutrientes que fortalecem as relações afetivas e a confiança em si mesmo e nas pessoas. Essa base sólida também é fundamental para a construção de valores e de habilidades relacionadas à aprendizagem e às interações sociais.

À medida que bebês, crianças e jovens se sentem acolhidos, eles são capazes de desenvolver sua autonomia e independência, pois sabem que, ao se arriscarem em novas conquistas, terão sempre uma base segura para onde retornar em caso de sofrimentos e decepções. Essa segurança afetiva é essencial inclusive quando os próprios pais, cuidadores ou educadores são os agentes de frustração, vivência necessária que os ajuda a construir a sua tolerância e resiliência às adversidades da vida.

* Mariangela Carocci. Pedagoga com formação na abordagem da pedagogia Waldorf baseada na Antroposofia. Psicopedagoga clínica, arte educadora e gestora de projetos sociais e educacionais junto às redes pública e privada. Pesquisadora da cultura da infância. Praticante e pesquisadora da Hatha Yoga e da medicina Ayurveda. Sócia-fundadora da Consultoria e Assessoria Fora do Casulo, que atua com projetos sociais e educacionais na rede intersetorial.

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