Por Anderson Borges Costa
O ex-Beatle John Lennon compôs uma canção antológica com os seguintes versos: “Imagine todas as pessoas/ vivendo a vida em paz”. Infelizmente, o mundo é um planeta no qual a paz ainda não reina. Há conflitos e guerras espalhados por vários cantos. E nem todos os cantos ou versos são capazes de silenciar a violência que se alastra.
Um dos embates mais sangrentos que castigam a humanidade é o conflito étnico que massacra vidas em Ruanda, um país sem saída para o mar, um país sem saída para o ar, cujo ar sufoca a vida, onde, em 1994, ocorreu um genocídio que assassinou cerca de 1 milhão de pessoas. Isso é pouco mais do que o número de vidas que foram ceifadas no Brasil devido à pandemia da Covid. A diferença é que o genocídio em Ruanda foi motivado por um vírus para o qual a vacina não tem se provado eficiente: o preconceito.
Em Ruanda, as etnias Hutu e Tutsi não conseguem conviver em harmonia. E o massacre que os Hutus impuseram aos Tutsis é o pano de fundo para o belo romance Nossa Senhora do Nilo, escrito pela ruandesa Scholastique Mukasonga. Nesse livro, a história se passa pouco antes do início do massacre, mas é possível observarmos os sinais de ódio entre as duas etnias. Scholastique conviveu desde pequena com a violência em seu país. O livro se concentra na intolerância na escola de elite Liceu Nossa Senhora do Nilo, um colégio para meninas, localizado no alto das montanhas da bacia do Congo e do Nilo, em Ruanda. O Liceu abrigava as garotas que faziam parte da elite e aplicava o sistema de cotas de maneira rigorosa, o qual limitava a 10% o número de alunas da etnia Tutsi. É nessa escola que as meninas experimentam incitações racistas e lutas políticas, tornando-se um microcosmo do que causou o genocídio poucos anos depois.
Por meio de uma escrita ágil e comovente, Nossa Senhora do Nilo é um livro que lemos na tentativa de fazer com que a canção de John Lennon seja um horizonte cada vez mais próximo.
Boas leituras!
Nossa Senhora do Nilo
Autora: Scholastique Mukasonga
Tradutora: Marília Garcia
Editora: Nos Editora
Número de página: 264
Anderson Borges Costa
Formado e pós-graduado em Letras (Português/Inglês/Alemão) pela Universidade de São Paulo. Professor de Português e Literatura na Escola Internacional St. Nicholas. Escritor, autor dos romances Rua Direita e Avenida Paulista, 22, do livro de contos O livro que não escrevi e de peças teatrais.