Por Marcella Erédia e Natasha Lima
Diferente do que muitos imaginam, a vida de um esportista tem mais desafios e obstáculos do que momentos de glória. Isso porque a verdadeira competição ocorre longe dos holofotes, muito antes dos poucos minutos, ou até mesmo segundos, que vemos nos estádios ou assistimos pela televisão.
Por meio do esporte, temos a oportunidade de nos desenvolver como sociedade. Não apenas pelo exercício da empatia e do trabalho em equipe, mas por esbarrarmos em questões políticas e sociais relevantes. Com base nos atletas e suas jornadas, debates como o racismo, a igualdade de gênero e a intolerância religiosa ganham projeção mundial.
Nesse sentido, os Jogos Olímpicos promovem a circulação de ideias. Seja pela adição de novas modalidades esportivas ou pelo aumento na diversidade dos atletas, o evento é capaz de divulgar talentos e histórias. No cinema não é diferente — os filmes que abordam a competição inspiram e despertam diversas emoções.
Nesta edição, trazemos dois exemplos desse tipo de trabalho: Raça, que conta a história da lenda do atletismo Jesse Owens, conhecido não só por bater recordes, mas também por enfrentar o racismo na década de 1930. E Carruagens de Fogo, que narra a trajetória de dois corredores ingleses que precisaram se superar para chegar às Olimpíadas.
Raça (2016)
Direção: Stephen Hopkins
Elenco: Stephan James (Jesse Owens), Jason Sudeikis (Larry Snyder), Jeremy Irons (Avery Brundage), Carice van Houten (Leni Riefenstahl) e David Kross (Carl ‘Luz’ Long)
Disponível para compra e aluguel no YouTube
Baseado em fatos reais, o filme narra a trajetória do atleta negro norte-americano e medalhista olímpico Jesse Owens. Ele ganhou quatro medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de Verão em Berlim, em 1936, durante o regime nazista. Ficou conhecido por protagonizar um dos momentos mais marcantes dos Jogos, tendo quebrado dois recordes mundiais de atletismo na mesma competição.
A luta de Jesse, no entanto, teve início muito antes desse episódio. De origem simples, ingressou na Universidade do Estado de Ohio a fim de melhorar a vida de sua família. Contou com o apoio do treinador e mentor Larry Snyder, mas em contrapartida, teve de lidar com as leis de segregação racial que conduziam os Estados Unidos na época.
Após vencer a competição e ganhar notoriedade em terras alemãs sob o regime de Adolf Hitler, Owens continuou sendo vítima do racismo em seu próprio país. Em uma das cenas, ele e a esposa são obrigados a entrar pelo elevador de serviço reservado a pessoas negras, em uma festa organizada justamente para homenageá-lo.
Raça nos conta mais do que a história de um atleta que superou dificuldades até chegar ao estrelato. É uma análise, ainda que sutil, do período que antecedeu a Segunda Guerra Mundial e da forma como o fascismo se instala na sociedade, por exemplo, pelas mensagens midiáticas e eventos esportivos.
A produção faz uma homenagem à lenda do esporte Jesse Owens, mas também traz à luz o problema da discriminação racial e seus impactos negativos na sociedade — que, infelizmente, ainda enfrentamos nos dias de hoje.
Carruagens de Fogo (1981)
Direção: Hugh Hudson
Elenco: Ben Cross (Harold), Ian Charleson (Eric), Ian Holm (Sam) e outros
Disponível apenas para compra
O filme conta a história de dois jovens corredores que disputam uma vaga nas Olimpíadas de 1924, em Paris. De um lado, Harold Abrahams, um judeu que busca mostrar seu valor para a alta sociedade inglesa e, do outro, Eric Liddel, um cristão dividido entre o desejo de correr e a missão de levar sua fé a outros continentes.
Para ambos, a corrida se apresenta como uma oportunidade de superar desafios pessoais e promover o autoconhecimento. Embora suas crenças e motivações sejam diferentes, Harold e Eric buscam encontrar respostas que os ajudarão a enfrentar a vida adulta. Diante de tantos olhares e expectativas, eles treinam para se tornar os melhores do mundo.
Assim como em Raça, Carruagens de Fogo também é inspirado em uma história real. Entretanto, por serem brancos e pertencerem à alta sociedade, a trajetória de Harold e Eric ao pódio é muito diferente da de Jesse Owens. Mesmo que as questões religiosas tragam premissas interessantes, o roteiro não as explora com a profundidade que merecem.
Ainda assim, o longa se tornou uma das maiores referências em filmes esportivos. Sua música tema, criada por Vangelis, renomado musicista grego, é tão conhecida que muitos acreditam se tratar do tema oficial das Olimpíadas. Carruagens de Fogo também faz parte do livro 1001 Filmes para Ver Antes de Morrer, de Steven Schneider.
Seus defensores alegam que o filme tem êxito em exaltar o espírito da competição: honestidade, perseverança e lealdade. Já os críticos dizem que o filme é superestimado e, mesmo tendo ganhado quatro Oscars, carece de momentos marcantes. Esse impasse quem resolve é você, querido leitor, que deverá assisti-lo para tirar as próprias conclusões.