Por Anderson Borges Costa

Você gosta de música latino-americana? E world music, curte? Já foi a uma livraria e viu prateleiras que separam autores com os rótulos de “ficção feminina”, “ficção afro-americana”, “ficção indígena”? Que rótulo você colaria em uma escritora branca, mulher, nascida na Bolívia? O artista, antes de criar sua arte, é preto, branco, indígena, latino, homem, mulher? Facilita ou reduz enquadrar um filme ou um livro em um estereótipo? É sobre esse processo que se debruça o ótimo filme Ficção Americana, indicado em cinco categorias no último Oscar.

Em Ficção Americana, o professor de literatura e escritor Thellonious Ellison, conhecido como Monk, está incomodado com o fato de escritores negros americanos publicarem histórias sempre iguais, que colocam personagens negros nas mesmas situações de vítimas de preconceito, pobreza, trabalhos pouco valorizados, comunicando-se com as mesmas gírias. Monk, um homem negro, escreve livros cujas temáticas são mais universais. E, ao ver seus livros na prateleira de “Autores afro-americanos”, quer levá-los para junto de livros de “Ficção americana”. Monk entende que a arte deve unir, não segregar em compartimentos.

O filme é uma crítica a Hollywood, que estimula a noção de estereótipos, de clichês, de reducionismos. Em Ficção Americana, Monk, ao ver o sucesso de uma autora negra que reproduz os estereótipos negros que ele tanto critica, revoltado, escreve um romance que segue à risca todos os clichês que ele detesta. E, para sua surpresa e enorme incômodo, o romance que ele escreve com raiva, cujo título nada sutil é Fuck, se torna um best-seller premiado.

Ficção Americana é um filme dentro de um filme. É um livro dentro de um livro. É uma música dentro de músicas. É um rótulo tentando se separar de rótulos. Mas não deixa de ser um filme, sujeito a ser encaixado em uma categoria. Ou em cinco categorias indicadas ao Oscar. Os atores estão ótimos, o enredo é surpreendente, o roteiro é muito bem adaptado. E a trilha sonora é original. Hollywood, apesar dos clichês, possibilita reflexões críticas. A ficção é uma arma. Segure-se no sofá, pois cinema também é movimento.
 

Ficção Americana (American Fiction) – Estados Unidos, 2023
Direção: Cord Jefferson
Elenco: Jeffrey Wright, Sterling K. Brown, Issa Era

Clique AQUI e assista ao trailer de Ficção Americana

 

 


Anderson Borges Costa
Formado e pós-graduado em Letras (Português/Inglês/Alemão) pela Universidade de São Paulo. Professor de Português e Literatura na Escola Internacional St. Nicholas. Escritor, autor dos romances Professoras, Rua Direita e Avenida Paulista, 22, do livro de contos O livro que não escrevi e de peças teatrais.

Foto capa: Amazon MGM Studios/Divulgação
Imagem mídia: Official American Fiction Poster Released
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