Por Anderson Borges Costa

Você sonha toda noite, sabia? Consegue se lembrar de todos os sonhos que tem? Já acordou no meio de um pesadelo, suando frio e aliviado ao saber que o sofrimento não era real? Então, pense em como você se sentiria se fosse o protagonista do romance A metamorfose, cujo primeiro parágrafo se inicia assim: “Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso”.

O autor deste livro clássico, o tcheco Franz Kafka, começa a história pelo clímax, que é justamente o momento em que Gregor Samsa entende que a realidade surgida após uma noite maldormida é um pesadelo real. Ou não? Afinal, acordar em sua cama transformado em um inseto com tamanho humano é estar diante de uma nova maneira de lidar com a família, com o trabalho, com os sentimentos, com a vida. Ao acordar metamorfoseado em um inseto, Gregor nasce para uma nova vida. Ou nasce para a consciência da vida como ela sempre foi, embora ele não a enxergasse assim.

A narrativa de A metamorfose é uma leitura que incomoda o leitor, pois é impossível não nos colocarmos no lugar desse homem, trabalhador exemplar, que sustentava os pais e a irmã na casa que com eles compartilhava. A correta vida de Gregor, da noite para o dia, ganha novas cores; ou perde todas as cores. O homem que nunca faltou ao trabalho e que pagou em dia todas as contas agora já não era mais visto com simpatia. Era rejeitado, sua voz não era ouvida, a porta de seu quarto era fechada para qualquer tentativa de comunicação. Gregor acordou para viver um pesadelo. E, para quem lê A metamorfose, cada parágrafo tem o peso de que estamos acordando para o fato de que a vida real é mais absurda do que nossos sonhos nos fazem crer. Leia A metamorfose. Bons sonhos e boas leituras!

 

A metamorfose, Franz Kafka
Editora Companhia das Letras

 

 


Anderson Borges Costa
Formado e pós-graduado em Letras (Português/Inglês/Alemão) pela Universidade de São Paulo. Professor de Português e Literatura na Escola Internacional St. Nicholas. Escritor, autor dos romances Professoras, Rua Direita e Avenida Paulista, 22, do livro de contos O livro que não escrevi e de peças teatrais.

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