Por Marcella Erédia e Natasha Lima

Historicamente, o cinema de horror sempre abordou questões sociais que marcaram o período em que foi produzido. Seja para fazer uma crítica, satirizar ou até mesmo endossar determinadas formas de pensamento, são filmes que usam a dicotomia entre o bem e o mal para atribuir valores e impactar seus espectadores.

Filmes de terror slasher, como O Massacre da Serra Elétrica (1974) e Halloween (1978), por exemplo, foram inspirados em casos reais de assassinato, como os crimes de Charles Manson, e pela emergência do termo serial killer, que teve forte presença nos noticiários e no imaginário norte-americano durante os anos 1970 e 1980.

Já os longas de ficção científica e terror da década de 1950, como Guerra dos Mundos (1953), exploravam o medo do desconhecido e de conflitos políticos internacionais, como a Guerra Fria. Durante o pós-Segunda Guerra Mundial, muitos viviam em estado de alerta, temendo invasões inimigas e o uso de armas de destruição em massa.

Nos dias de hoje não é diferente. Diversas produções abordam problemas contemporâneos e dialogam com discursos produzidos pela sociedade. Nesta edição especial do mês de outubro, selecionamos três opções de filmes que carregam essa característica: Rua do Medo (2021), Saint Maud (2019) e Nós (2019).

Por representarem subgêneros de filmes de horror diferentes, esperamos que — se não todos — ao menos um possa te proporcionar calafrios, sustos e muito divertimento.

Saint Maud (2019)
Direção: Rose Glass
Elenco: Morfydd Clark (Maud), Jennifer Ehle (Amanda), Lily Fraser (Carol), Lily Knight (Joy)
Disponível no YouTube Filmes

O filme conta a história de Maud, uma enfermeira que está se recuperando de uma situação traumática e que encontrou, por meio da fé, um novo propósito de vida. A protagonista é contratada para cuidar de uma mulher em estágio terminal de câncer e, nesse novo trabalho, suas crenças começam a ser testadas.

Saint Maud é uma produção britânica que teve o lançamento bastante afetado pela pandemia. Por isso, o filme acabou sendo menos conhecido e comentado, o que é uma pena, por se tratar de um enredo tão rico em possibilidades de debate. Entre suas principais temáticas estão o extremismo religioso e a complexidade humana.

O longa traz uma proposta inovadora, pois se afasta dos clichês do cinema de horror. Nele, o medo é muito mais humano, pois se baseia em situações que soam familiares. É um filme cheio de detalhes, especialmente para aqueles que gostam de sutilezas como jogos de câmera e recursos de iluminação.

Dentre os três títulos apresentados neste artigo, Saint Maud é, de longe, a opção mais “suave”, com menos sustos. Se você gosta de ver críticas sociais, um bom suspense e prefere não sofrer com filmes mais assustadores, esta poderá ser a sua escolha ideal — mas, é claro, isso não significa que você sairá ileso!

Nós (2019)
Direção: Jordan Peele
Elenco: Lupita Nyong’o (Adelaide), Winston Duke (Gabe), Shahadi Wright Joseph (Zora), Evan Alex (Jason), Elisabeth Moss (Kitty) e outros
Disponível na Netflix

Adelaide é uma mãe realizada, tem dois filhos adoráveis, Zora e Evan, e um marido dedicado, Gabe. A família decide passar um fim de semana na praia, mas é surpreendida por visitantes inesperados, um grupo de pessoas com a aparência idêntica às suas. Seres misteriosos e sombrios, que usam macacões vermelhos.

Diferente do primeiro sucesso de bilheteria de Jordan Peele, Corra (2017), o longa não fala sobre o racismo. Nessa nova história, o diretor opta por abordar o ódio e o medo no mundo contemporâneo de forma mais ampla, aproximando-se de debates que antecederam a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.

Nós é um filme de terror completo, pois contém cenas de susto, perseguições e grandes reviravoltas. Além disso, possui camadas mais profundas, passando por questões psicológicas e pela violência enraizada na história da humanidade. Seu grande destaque é, sem dúvida, a atuação de Lupita Nyong’o, cuja expressividade dá sentido ao filme.

Caso você tenha gostado de Corra, este filme poderá te surpreender ainda mais. Se não tiver gostado, Nós poderá ser o trabalho que te fará admirar a direção de Jordan Peele. Em nossa opinião, é um dos filmes de terror mais impactantes da última década, não somente pelo seu potencial de causar sustos, mas pela sua representação do ódio.

Rua do Medo: 1994, 1978 e 1666
Direção: Leigh Janiak
Elenco: Kiara Madeira (Deena), Olivia Scott (Sam), Sadie Sink (Ziggy), Ashley Zukerman (Nick Good), Benjamin Flores Jr. (Josh) e outros
Disponível na Netflix

Rua do Medo é uma série composta por três filmes, Rua do Medo 1994, 1978 e 1666. Conforme o telespectador avança na narrativa, ele volta no tempo e vai descobrindo fatos que completam a história principal. Lançada de forma inovadora, em três sextas-feiras consecutivas, a série prende a atenção e gera curiosidade sobre o seu final.

Os filmes contam a história de Deena, uma adolescente que tem um relacionamento interrompido e, durante uma briga, acaba deparando com terríveis assassinatos e eventos malignos. Segundo as lendas locais, uma bruxa chamada Sarah Fier teria jogado uma maldição sobre a cidade e, para salvar as pessoas que ama, Deena terá que detê-la.

Os três longas são inspirados por grandes clássicos slasher dos anos 1980 e 1990, trazendo elementos que fazem referência a cenas e personagens famosos. Mesmo assim, por serem ambientados em épocas diferentes, cada filme aborda o horror de forma independente, fazendo com que cada parte tenha grandes surpresas e novidades.

O diferencial deste projeto é, em nossa opinião, a forma como a diretora utiliza-se do subgênero para atualizar as representações e incorporar novas narrativas. As mulheres de Rua do Medo, por exemplo, protagonizam cenas que quebram expectativas baseadas em “pré-conceitos” que décadas de filmes de terror ajudaram a consolidar.

Por se tratar de trabalhos com muitas cenas de susto e violência, olhares menos atentos poderão julgar Rua do Medo como um filme “mais do mesmo”. Entretanto, aqueles que prestarem atenção nas sutilezas e inversões de papéis, principalmente em relação aos grandes clássicos, encontrarão algo além do divertimento.

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